Outros Argumentos Ateológicos (onisciência e liberdade, etc)

Alvin Plantinga

Origem: God, Freedom and Evil, pp. 65-74

Tradução: teismocristao.wordpress.com

[Trata rapidamente de críticas anti-teístas à la Freud e Marx e do verificacionismo, se concentrando, depois, na ideia de que a onisciência de Deus é incompatível com a liberdade humana]

   Há muitas outras considerações que as pessoas às vezes trazem contra a crença teísta. Entre estas, por exemplo, estão a alegação freudiana de que a crença teísta é uma questão de realização do desejo e a sugestão Marxista de que a religião é um método através do qual um segmento da sociedade oprime outro. Mas são esses alegados fatos supostas razões para pensar que o teísmo é falso? Se sim, elas não conseguem muita coisa. É um fato que aqueles que acreditam em um Pai Celestial o fazem porque, ou parcialmente porque, seus pais terrestres eram inadequados? Eu duvido. Se esse for um fato, porém, é um de interesse psicológico e não teológico. Pode nos ajudar a entender os teístas, mas não nos diz nada sobre a veracidade de sua crença; para esse fim, é simplesmente irrelevante.

   O verificacionismo é outra abordagem ateológica – uma mais comum alguns anos atrás, talvez, do que no presente. Essa é a afirmação de que uma sentença tem sentido ou é literalmente significante somente se ela pode ser empiricamente verificada – ou seja, grosseiramente, somente se sua veracidade pode ser determinada pelos métodos da ciência natural. Como declarações sobre Deus não cumprem essa condição (assim é dito), elas são, falando estritamente, pura bobagem. Como elas não têm nenhum conteúdo e não dizem absolutamente nada, elas não tem nem mesmo a sorte de ser falsas. Uma sentença teológica, na visão em questão, é um absurdo gritante se passando por uma afirmação sensitiva.25 Em seus dias prósperos – os anos 30 e 40 – o verificacionismo desfrutava ampla aceitação, assim como um ar delicioso de ser avant-garde com ele. Porém, hoje em dia, poucos (se é que os há) filósofos estão dispostos a se chamar de verificacionistas, talvez por duas razões. Primeiro, parece ser impossível afirmar o assim-chamado “critério de verificabilidade” de maneira a excluir declarações teológicas e metafísicas sem prestar o mesmo favor a declarações científicas e de senso-comum. Além disso, não parece haver nenhuma razão sequer porque um teísta, ou qualquer outra pessoa que mantenha crenças excluídas pelo critério de verificabilidade, deva sentir a menor obrigação de aceitar esse critério.26 Não direi, portanto, mais nada sobre esse tipo de ateologia.

    O último argumento que eu quero discutir é, talvez, apenas levemente ateológico. Essa é a afirmação de que a onisciência de Deus é incompatível com a liberdade humana. Muitas pessoas estão inclinadas a pensar que, se Deus é onisciente, então seres humanos nunca são livres. Por quê? Porque a ideia de que Deus é onisciente implica que, em qualquer tempo dado, Deus sabe não apenas o que aconteceu e o que está acontecendo, mas também o que vai acontecer. Ele sabe o futuro tão bem quanto o passado. Mas, agora, suponha que Ele sabe que Paul vai realizar alguma ação trivial amanhã – comer uma laranja no almoço, digamos. Se Deus sabe em avanço que Paul vai comer uma laranja no almoço amanhã; e se deve ser o caso que Paul coma uma laranja no almoço amanhã, então não é possível que Paul abstenha-se de fazê-lo – em qual caso ele não será livre para se abster, e portanto não será livre em relação à ação de comer uma laranja. Então, se Deus sabe, em avanço, que uma pessoa vai executar uma determinada ação A, então essa pessoa não é livre em relação a essa ação. Porém, se Deus é onisciente, então para qualquer pessoa e qualquer ação que ela execute, Deus sabia em avanço que ela executaria essa ação. Então, se deus é onisciente, ninguém nunca é livre para realizar qualquer ação livre.

    Esse argumento pode, inicialmente, soar plausível, mas o fato é que ele é baseado em uma confusão. A porção central pode ser dita como se segue:

(49) Se Deus sabe em avanço que X fará A, então deve ser o caso que X fará A

e

(50) Se deve ser o caso que X fará A, então X não é livre para se abster de A.

   De (49) e (50) segue que, se Deus sabe em avanço que alguém tomará certa ação, então essa pessoa não é livre em relação a essa ação. Porém, (49) precisa de mais inspeção. Por que deveríamos pensar que ela é verdade? Pois, nos será dito, se Deus sabe que X fará A, então segue logicamente que X fará A: é necessário que, Se Deus sabe p, então p é verdade. Mas essa defesa de (49) sugere que este é ambíguo; ele pode significar ou

 (49a) Necessariamente, se Deus sabe em avanço que X fará A, então de fato X fará A

ou

 (49b) Se Deus sabe em avanço que X fará A, então é necessário que X fará A.

    O argumento ateológico requer a verdade de (49b); porém, a defesa acima de (49) apoia apenas (49a), não (49b). É, de fato, necessariamente verdade que, se Deus (ou qualquer outra pessoa) sabe que uma proposição P é verdadeira, então P é verdadeira; mas simplesmente não se segue que, se Deus sabe P, então P é necessariamente verdade. Se eu sei que Henry é um solteiro, então Henry é um solteiro é uma verdade necessária; não se segue que, se eu sei que Henry é um solteiro, então é necessariamente verdade que ele é. Eu seu que Henry é um solteiro: o que se segue é, apenas, que Henry é casado é falso; não se segue que é necessariamente falso.

    Então, a afirmação de que a onisciência divina é incompatível com a liberdade humana parece ser baseada em confusão. Nelson Pike27 sugeriu uma revisão interessante dessa velha alegação: ele mantém, não que a liberdade humana é incompatível com Deus ser onisciente, mas com Deus ser essencialmente onisciente. Lembre-se (p. 50) que um objeto X tem uma propriedade P essencialmente se X tem P em todo mundo em que X existe – se, isto é, for impossível que X existisse e não tivesse P. Agora, muitos teólogos e filósofos mantiveram que pelo menos algumas das propriedades importantes de Deus são essenciais a ele nesse sentido. É plausível manter, por exemplo, que Deus é essencialmente onipotente. As coisas poderiam acontecer diferentemente em várias maneiras; porém, se não houvesse nenhum ser onipotente, então Deus não existiria. Ele não poderia ter sido nada-poderoso ou limitado em poder. Mas o mesmo pode ser dito sobre a onisciência de Deus; Ele sabe toda proposição verdadeira e não acredita em nenhuma que seja falsa. Se Ele é essencialmente onisciente, prosseguindo, então Ele não apenas não é limitado em conhecimento; Ele não poderia ter sido. Não há nenhum mundo possível em que Ele existe e falha em saber alguma verdade, ou acredita em alguma falsidade. E a afirmação de Pike é que essa crença – a crença que Deus é essencialmente onipotente – é inconsistente com a liberdade humana.

   Para argumentar seu ponto, Pike considera o caso de Jones, que cortou sem gramado em T2 – último sábado, digamos. Agora, suponha que Deus é essencialmente onisciente. Então, em qualquer tempo anterior T1 – 80 anos atrás, por exemplo -, Deus acreditava que Jones cortaria seu gramado em T2. O argumento de Pike (em suas próprias palavras) então procede como se segue:

  1. ”Deus existia em T1” implica que “Se Jones fez X em T2, Deus acreditou, em T1, que Jones faria X em T2.”
  2. “Deus acredita em X” implica que “X é verdade”.
  3. Não está em poder de alguém, em um determinado tempo, fazer algo que possui uma descrição que é logicamente contraditória.
  4. Não está em poder de alguém, em um determinado tempo, fazer algo que faria com que alguém que mantinha certa crença em um tempo anterior ao tempo em questão não mantivesse essa crença no tempo anterior ao tempo me questão.
  5. Não está em poder de alguém, em um determinado tempo, fazer algo que faria com que uma pessoa que existia em um tempo anterior não existisse nesse tempo anterior
  6. Se Deus existia em T1 e Deus acreditava, em T1, que Jones faria X em T2, então, se estivesse em poder de Jones, em T2, se abster de X, então (1) estava em poder de Jones, em T2, fazer algo que faria com que Deus mantivesse uma crença falsa em T1, ou (2) estava em poder de Jones, em T2, fazer algo que faria com que Deus não mantivesse a crença que Ele manteve em T1, ou (3) estava em poder de Jones, em T2, fazer algo que faria com que qualquer pessoa que acreditasse, em T1, que Jones faria X em T2 (uma a qual era, por hipótese, Deus) acreditasse em uma crença falsa e, portanto, não fosse Deus – ou seja, que Deus (que por hipótese existia em T1) não existisse em T1
  7. A alternativa 1 no consequente do item 6 é falsa (de 2 e 3)
  8. A alternativa 2 no consequente do item 6 é falsa (de 4)
  9. A alternativa 3 no consequente do item 6 é falsa (de 5)
  10. Portanto, se Deus existia a T1, e Deus acreditava, em T1, que Jones faria X em T2, então não estava em poder de Jones, em T2, se abster de fazer X (de 1 e 10)28

   O que dizer sobre esse argumento? As duas primeiras premissas simplesmente tornam explícito parte do que está envolvido na ideia de que Deus é essencialmente onisciente, então não tem nada o que discutir com elas. As premissas 3-5 também parecem corretas. Porém, aquela complicada premissa (6) merece um olhar mais atento. O quê, exatamente, ela diz? Acho que podemos entender Pike, aqui, como se segue. Considere

(51) Deus existia em T1, e Deus acreditava, em T1, que Jones faria X em T2, e estava em poder de Jones se abster de fazer X em T2.

O que Pike quer dizer, creio, é que (51) ou implica

(52) Estava em poder de Jones, em T2, fazer algo que faria com que Deus mantivesse uma crença falsa em T1

ou (51) implica

(53) Estava em poder de Jones, em T2, fazer algo que faria com que Deus não mantivesse a crença que Ele de fato mantinha em T1

ou implica

(54) Estava em poder de Jones, em T2, fazer algo que faria com que qualquer pessoa que acreditasse, em T1, que Jones faria X em T2 (uma a qual era, por hipótese, Deus) mantivesse uma crença falsa e, portanto, não era Deus – ou seja, que Deus (que, por hipótese, existia em T1) não existia em T1.

[O resto do raciocínio consiste em argumentar que tanto (52), (53) e (54) são necessariamente falsos, se Deus é essencialmente onisciente; portanto (51) é falso, se Deus é essencialmente onisciente, o que significa que Deus ser essencialmente onisciente é incompatível com a liberdade humana.] Agora suponha que olhemos estes um de cada vez. (51) implica (52)? Não. (52) diz que estava em poder de Jones fazer algo – nominalmente, se abster de fazer X – tal que, se ele tivesse feito essa coisa, então Deus teria mantido uma crença falsa em T1. Mas isso não segue de (51). Se Jones tivesse se abstido de fazer X, então uma proposição na qual Deus de fato acreditou teria sido falsa; porém, se Jones tivesse se abstido de fazer X em T2, então Deus (já que Ele é onisciente) não teria acreditado, em T1, que Jones fará X em T2 – de fato, Ele teria mantido a crença verdadeira de que Jones se absterá de fazer X em T2. O que segue de (51) não é (52), mas apenas (52’):

(52’) Estava em poder de Jones fazer algo tal que, se ele tivesse feito isso, então uma crença que Deus não manteve em T1  teria sido falsa.

Mas (52’) não é nem um pouco paradoxal e, em particular, não implica que estava em poder de Jones fazer algo que faria com que Deus mantivesse uma crença falsa.

   Talvez possamos ver isso mais claramente se o olharmos através do ponto de vantagem dos mundos possíveis. Nos é dito por (51) tanto que no mundo real Deus acredita que Jones faz X em T2 quanto que está em poder de Jones se abster de fazer X em T2. Agora considere qualquer mundo W em que Jones de fato se abstém de fazer X. Nesse mundo, uma crença que Deus mantém no mundo real – em Kronos – é falsa. Isto é, se W fosse atual, então a crença que Deus de fato mantém teria sido falsa. Porém, não se segue que em W Deus mantém uma crença falsa. Pois não segue que, se W tivesse sido atual, Deus teria acreditado que Jones faria X em T2. De fato, se Deus é essencialmente onisciente (onisciente em todo mundo no qual Ele existe), o que se segue é que, em W, Deus não acreditou, em T1, que Jones vai fazer X em T2; Ele acreditou, pelo contrário, que Jones se absterá de fazer X. Então, (51) não implica de nenhuma maneira que estava em poder de Jones fazer com que Deus mantivesse uma falsa crença em T1.

   E quanto a

(53) Estava em poder de Jones, em T2, fazer algo que faria com que Deus não mantivesse a crença que Ele de fato mantinha em T1?

Aqui, o primeiro problema é um de entendimento. Como devemos entender essa  proposição? Uma maneira é essa. O que (53) diz é que estava em poder de Jones, em T2, fazer algo tal que, se ele tivesse feito isso, então em T1 Deus teria mantido certa crença e não mantido essa crença. Isto é, (53) assim entendida atribui a Jones o poder de criar um estado de coisas contraditório [chame essa interpretação de (53a)]. (53a) é óbvia e retumbantemente falsa; mas não há nenhuma razão sequer para pensar que (51) implica ela. O que (51) implica é, ao contrário

(53b) Estava em poder de Jones, em T2, fazer algo tal que, se ele tivesse feito isso, então Deus não teria mantido uma crença que ele de fato manteve.

Isso segue de (51), mas é perfeitamente inocente. Pois, suponha novamente que (51) é verdade, e considere um mundo W em que Jones se abstém de fazer X. Se Deus é essencialmente onisciente, então nesse mundo W Ele é onisciente e, portanto, não acredita, em T1, que Jones fará X em T2. Então, o que segue de (51) é a inofensiva afirmação de que estava em poder de Jones fazer algo tal que, se ele tivesse feito isso, então Deus não manteria uma crença que Ele de fato (no mundo real) mantém.  Porém, por nenhum motivo imaginável se segue que, se Jones tivesse feito isso, então seria verdade que Deus de fato manteve uma crença que Ele não manteve. Tomada de uma forma (53) é obviamente falsa, mas não uma consequência de (51); tomada de outra, é a consequência de (51), mas de nenhuma maneira obviamente falsa.

   (54) não vai nem um pouco melhor. O que ela diz é que estava em poder de Jones, em T2, fazer algo tal que, se ele tivesse feito isso, então Deus não teria sido onisciente e, portanto, não teria sido Deus. Mas isso simplesmente não segue de (51). Este, é claro, de fato implica

(54’) Estava em poder de Jones fazer algo tal que, se ele tivesse feito isso, então qualquer pessoa que acreditasse em T1 que Jones faria X em T2 teria mantido uma crença falsa.

Pois suponha novamente que (51) é de fato verdade, e agora considere um desses mundos W em que Jones se abstém de fazer X. Nesse mundo

(55) Qualquer pessoa que acreditava, em T1, que Jones faria X em T2 manteve uma crença falsa

é verdade. Isto é, tivesse W sido atual, (55) teria sido verdade. Mas, novamente, no mundo W Deus não acredita que Jones fará X em T2; (55) é verdade em W, mas não é relevante a Deus aqui.  Se Jones tivesse se abstido de fazer X, então (55) teria sido verdade. Não se segue que Deus não teria sido onisciente; pois nesses mundos em que Jones não faz X em T2, Deus não acredita, em T1, que ele faz.

   Talvez o seguinte seja uma possível fonte de confusão aqui. Se Deus é essencialmente onisciente, então ele é onisciente em cada mundo possível no qual Ele existe. Por consequência, não há nenhum mundo possível em que Ele mantenha uma crença falsa. Agora considere qualquer crença que Deus de fato mantém. Pode ser tentador supor que, se Ele é essencialmente onisciente, então Ele mantém essa crença em todo mundo no qual ele existe. Porém, é claro, isso não segue. Não é essencial à Ele manter as crenças que Ele de fato mantém; o que é essencial à Ele é a propriedade bem diferente de manter apenas crenças verdadeiras. Então, se uma crença é verdadeira em Kronos, mas falsa em algum mundo W, então em Kronos Deus mantém essa crença e, em W, não.

   Muito mais deveria ser dito sobre a peça de Pike, e ainda há muitos detalhes fascinantes. Eu vou deixar eles para você, porém. E, para concluir nosso estudo de ateologia natural: nenhum dos argumentos que nós examinamos tem perspectivas de sucesso; todos são inaceitáveis. Há argumentos que não consideramos, é claro; mas até agora a conclusão indicada é que a ateologia natural não funciona.

Notas

25. Uma declaração clássica e legível do verificacionismo é Language, Truth and Logic (Londres: Gollancz, 1946) de A. J. Ayer.

26. Para um relato crítico do verificacionismo veja Plantinga, God and Other Minds, cap. 7.

27. Nelson Pike, “Divine Omniscience and Voluntary Action,” Philosophical Review 74 (Janeiro 1965):27.

28. Ibid, pp 33-34

Critícas Teístas ao Ateísmo

William Lane Craig (tradução: teismocristao.wordpress.com)

Um relato do ressurgimento do teísmo filosófico em nosso tempo, incluindo um breve levantamento de argumentos anti-teístas proeminentes, como a presunção do ateísmo, a incoerência do teísmo e o problema do mal, juntamente com uma defesa de argumentos teístas, como o argumento da contingência, o argumento cosmológico, o argumento teleológico e o argumento moral.

Versão resumida no The Cambridge Companion to Atheism, pp. 69-85. Ed. M. Martin. Cambridge Companions to Philosophy. Cambridge University Press, 2007 (mais informações aqui)

Introdução

O ultimo meio século testemunhou uma verdadeira revolução na filosofia Anglo-Americana. Em uma retrospectiva recente, o eminente filósofo de Princeton Paul Benacerraf relembra como era fazer filosofia em Princeton durante os anos 1950 e 60. O modo esmagadoramente dominante de se pensar era o naturalismo científico. A metafísica havia sido derrotada, expulsa da filosofia como um leproso impuro. Qualquer problema que não pudesse ser tratado pela ciência era simplesmente descartado como um pseudoproblema. O verificacionismo reinava triunfantemente sobre a ciência emergente da filosofia. “Esse novo iluminismo iria pôr as antigas visões e atitudes metafísicas de lado e substituí-las com o novo modo de se fazer filosofia. “1

O colapso do Verificacionismo foi, sem nenhuma dúvida, o evento filosófico mais importante do século vinte. Seu falecimento significou a ressurreição da metafísica, assim como de outros problemas tradicionais da filosofia que o Verificacionismo havia suprimido. Acompanhando este ressurgimento veio algo novo e completamente inesperado: um renascimento da filosofia Cristã.

Como resultado, a face da filosofia Anglo-Americana foi transformada. O teísmo está crescendo; o ateísmo declinando.2 O ateísmo, talvez ainda o ponto de vista dominante na universidade Americana, é uma filosofia em retirada. Em um recente artigo no jornal secularista Philo, Quentin Smith lamenta o que ele chama de “a dessecularização da academia que evoluiu nos departamentos de filosofia desde o fim dos anos 1960.” Ele reclama:

Naturalistas assistiram passivamente enquanto versões realistas do teísmo. . . começaram a adentrar a comunidade filosófica, até que hoje talvez um quarto ou um terço dos professores de filosofia são teístas, a maior parte Cristãos ortodoxos . . . . na filosofia, se tornou, quase do dia pra noite, “academicamente respeitável” argumentar pelo teísmo, fazendo da filosofia um campo de entrada favorito para os mais inteligentes e talentosos teístas entrando na academia hoje em dia.3

Smith conclui: “Deus não está ‘morto’ na academia; ele voltou à vida no fim dos anos 1960 e está agora vivo e bem em sua última fortaleza acadêmica, departamentos de filosofia.”4

Como vanguardas de um novo paradigma filosófico, filósofos teístas têm livremente emitido várias críticas ao ateísmo. Em um espaço tão curto como esse verbete, é impossível fazer mais que um esboço deles e providenciar direcionamento para leituras futuras. Essas críticas poderiam ser agrupadas em dois eixos principais básicos: (1) Não há argumentos convincentes em favor do ateísmo, e (2) Existem argumentos convincentes em favor do teísmo.

Nenhum Argumento Convincente em favor do Ateísmo

Presunção do ateísmo. Teístas queixam-se de que os argumentos usuais contra a existência de Deus não chegam a ser filosoficamente aceitáveis. Uma das justificações do ateísmo mais proferidas tem sido a assim-chamada presunção do ateísmo. Ao pé da letra, essa é a afirmação de que na ausência de evidência para a existência de Deus, nós devemos presumir que Deus não existe. Assim entendida, tal alegada presunção parece confundir ateísmo e agnosticismo. Quando se olha mais cuidadosamente à como os protagonistas da presunção do ateísmo usam o termo “ateu”, porém, se descobre que eles estão, às vezes, redefinindo a palavra para indicar meramente a ausência de crença em Deus. Essa redefinição trivializa a afirmação da presunção do ateísmo, visto que nessa definição o ateísmo deixa de ser uma posição, e até mesmo criancinhas contam como ateus. Uma pessoa ainda necessitária de alguma justificativa para saber se Deus existe ou se Ele não existe.

Outros proponentes da presunção do ateísmo usam a palavra no sentido padrão, mas insistem que é precisamente a ausência de evidência para o teísmo que justifica suas afirmativas de que Deus não existe. O problema dessa posição é capturado impecavelmente pelo aforismo, amado por cientistas forenses, que afirma que “Ausência de evidência não é evidência de ausência”. A ausência de evidência é evidência de ausência somente em casos nos quais, fosse postulada a existência da uma entidade, nós deveriamos esperar encontrar mais evidência de sua existência do que temos. Em relação à existência de Deus, compete ao ateu provar que caso Deus existisse Ele providenciaria mais evidências de Sua existência do que nós temos. Esse é um ônus de prova enormemente para o ateu aguentar, por duas razões: (1) Pelo menos no teísmo cristão, a principal maneira pela qual chegamos a conhecer Deus não é através de evidências, mas pelo trabalho interno do Seu Espírito Santo, que é eficaz em trazer pessoas à uma relação com Deus inteiramente à parte de evidências.5 (2) No teísmo Cristão Deus providenciou os milagres estupendos da criação do universo a partir de nada e da ressurreição de Jesus de entre os mortos, eventos para quais há boa evidência histórica e científica – para não mencionar todos os outros argumentos da teologia natural.6 A luz disso, a presunção do ateísmo parece presunçosa, de fato!

O debate entre filósofos contemporâneos, portanto, moveu-se além da fácil presunção do ateísmo para uma discussão da assim-chamada “Ocultação de Deus” – com efeito, uma discussão sobre a probabilidade ou expectação de que Deus, caso Ele existisse, deixaria mais evidências de Sua existência do que o que nós temos. Insatisfeitos com a evidência que temos, alguns ateus argumentaram que Deus, caso Ele existisse, teria prevenido a descrença do mundo ao fazer Sua existência nitidamente aparente. Mas por que Deus iria querer fazer tal coisa? Na visão Cristã é uma matéria de relativa indiferença para Deus se as pessoas acreditam que Ele existe ou não. Pois o que Deus está interessado é em construir uma relação de amor conosco, não apenas nos fazer acreditar que Ele existe. Não há nenhuma razão para pensar que, se Deus fizesse Sua existência mais manifesta, mais pessoas chegariam a uma relação salvífica com ele. Na verdade, não temos nenhuma maneira de saber que, em um mundo de pessoas livres no qual a existência de Deus é tão óbvia como o nariz em nossos rostos, mais pessoas viriam a amá-Lo e conhecer Sua salvação do que no mundo atual. Então, porém, a afirmação de que se Deus existisse Ele faria Sua existência mais evidente do que ela é tem pouca ou nenhuma base, minando assim a afirmação de que a ausência de tal evidência é em si mesma prova positiva de que Deus não existe. Pior ainda, se Deus é dotado de conhecimento médio, de tal forma que Ele sabe como qualquer pessoa livre agiria sob qualquer circunstância em que Deus pudesse coloca-la, então Deus pode ter providenciado o mundo atual de maneira a providenciar somente aquelas evidências e dons do Espírito Santo que Ele sabia que seriam adequadas para trazer aqueles com coração e mente abertas à fé salvífica. Portanto, a evidência é tão adequada quanto precisa ser.

(In)coerência do Teísmo. Uma das principais preocupações da Filosofia da Religião contemporânea é a coerência do teísmo. Durante a geração anterior o conceito de Deus era muitas vezes considerado um campo fértil para argumentos anti-teístas. A dificuldade com o teísmo, era dito, não era somente que não havia bons argumentos para a existência de Deus, mas, mais fundamentalmente, que a noção de Deus é incoerente.

Essa crítica anti-teísta evocou uma prodigiosa literatura dedicada à análise filosófica do conceito de Deus. Dois controles tendem a orientar este inquérito quanto à natureza divina: a Escritura e a teologia do Ser Perfeito. Para pensadores na tradição Judaico-Cristã, a concepção Anselmiana de Deus como o maior ser concebível ou o ser mais perfeito tem guiado especulações filosóficas sobre os dados brutos da escritura, de tal forma que os atributos bíblicos de Deus devem ser concebidos de maneiras que sirvam para exaltar a grandiosidade de Deus. Como o conceito de Deus não é determinado pelos dados bíblicos, e como o que constitui uma propriedade “que confere grandeza” é até certo ponto discutível, filósofos que trabalham dentro da tradição judaico-cristã desfrutam de liberdade considerável na formulação de uma doutrina de Deus filosoficamente coerente e biblicamente fiel. Teístas, assim, acham que críticas anti-teístas de certas concepções de Deus podem ser, na verdade, bem úteis para formular uma concepção mais adequada.

Por exemplo, a maioria dos filósofos cristãos da religião estão, atualmente, bastante contentes em negar que Deus é simples ou impassível ou imutável em qualquer sentido irrestrito, embora teólogos medievais afirmassem tais atributos divinos, visto que esses atributos não são atribuídos à Deus na Bíblia (e, até mesmo, parecem ser incompatíveis com as descrições bíblicas de Deus) e não são claramente conferidoras de grandeza. Acaso se verifique que certas noções como onipotência ou onisciência são inerentemente paradoxais sob certas definições (que nenhum ser pode ter todos os poderes, por exemplo, ou saber todas as verdades), essa conclusão, embora de considerável interesse acadêmico, seria, no fim, de pouca importância teológica, já que o que Deus não pode fazer ou saber em tais casos é tão recôndito que nenhuma incompatibilidade é assim demonstrada com o Deus descrito na Bíblia.

De fato, porém, uma doutrina dos atributos de Deus coerente pode ser formulada. Veja a onipotência, por exemplo. Esse atributo teimosamente resistiu a uma formulação adequada até a análise de Flint e Freddoso, publicada em 1983. Um aspecto chave sobre o conceito de onipotência é que ela deve ser definida em termos da capacidade de atualizar certos estados de coisas, em vez de termos de poder bruto. Portanto, a onipotência não deve ser entendida como o poder que é ilimitado em sua quantidade ou variedade. Se nós entendemos a onipotência em termos da habilidade de atualizar certos estados de coisas, então não é nenhuma atenuação da onipotência de Deus que Ele não pode fazer uma pedra pesada demais para Ele levantar, pois, visto que Deus é essencialmente onipotente, “uma pedra pesada demais para Deus levantar” descreve um estado de coisas tão logicamente impossível quanto “um triângulo quadrado” e, portanto, não descreve absolutamente nada.

Devemos dizer, então, que um agente S é onipotente se e somente se S pode atualizar qualquer estado de coisas que é amplamente logicamente possível? Não, pois certos estados de coisas podem ser logicamente possíveis, embora devido à passagem do tempo não sejam mais possíveis de atualizar. Chamemos estados de coisas passados que não são indiretamente atualizáveis por alguém após elas de passado “rígido”. Devemos, então, dizer que um agente S é onipotente em um tempo t se e somente se S pode, em t, atualizar qualquer estado de coisas que é amplamente logicamente possível para alguém compartilhando do mesmo passado rígido que S atualizar em t? Parece que não. Porque contrafatuais sobre ações livres criam outro problema. Tem-se controle sobre contrafatuais acerca das decisões livres de si mesmo, mas não sobre contrafatuais acerca das decisões livres de outros. Isso implica que uma definição adequada de onipotência não pode requerer que S seja capaz de atualizar estados de coisas descritos por contrafatuais acerca das decisões livres de outros agentes, pois isso seria demandar de S o logicamente impossível. Devemos dizer, então, que S é onipotente em um tempo t se e somente se S pode, em t, atualizar qualquer estado de coisas que é amplamente logicamente possível para S atualizar, dado o mesmo passado rígido em t e os mesmos contrafatuais verdadeiros acerca dos atos livres de outros? Essa parece quase certa. Porém, está aberta à reclamação de  que, se S é essencialmente incapaz de qualquer ação em particular, não importando o quão trivial, então a inabilidade de S para realizar essa ação não conta contra sua onipotência. Portanto, devemos abrandar a definição de tal forma a requerer que S desempenhe qualquer ação que qualquer agente em seu estado de coisas pudesse executar. A seguinte análise parece satisfatória: S é onipotente em um tempo t se e somente se S pode, em t, atualizar qualquer estado de coisas que não é descrita por contrafatuais acerca dos atos livres de outros e que é amplamente logicamente possível para alguém atualizar, dado o mesmo passado rígido em t e os mesmos contrafatuais verdadeiros sobre os atos livres de outros. Tal análise define com sucesso os parâmetros da onipotência de Deus sem impor nenhum limite não-lógico ao Seu poder.

Ou considere a onisciência. Na descrição padrão da onisciência, para qualquer pessoa S, S é onisciente se e somente se S sabe toda proposição verdadeira e não acredita em nenhuma proposição falsa. Nessa descrição, a excelência cognitiva de Deus é definida em termos de seu conhecimento proposicional. Algumas pessoas têm acusado que a onisciência, assim definida, é uma noção inerentemente paradoxal, como o conjunto de todas as verdades. Mas a definição padrão não nos compromete a qualquer tipo de totalidade de todas as verdades, porém apenas à quantificação universal em relação a verdades: Deus sabe toda verdade. Além disso, a definição padrão não propõe nos dizer o modo do conhecimento de Deus, mas meramente seu escopo e acurácia. Teólogos cristãos não tem tipicamente considerado o conhecimento de Deus como proposicional em natureza, mas como uma intuição não-dividida da realidade, a qual nós conhecedores finitos representamos para nós mesmos em termos de proposições. Nós expressamos proposicionalmente o que Deus sabe não-proposicionalmente. Nessa maneira de ver as coisas não existe, de fato, um número infinito de proposições, mas apenas tantas proposições quanto seres humanos tenham conscientizado. De fato, se alguém é um ficcionalista em relação a objetos abstratos como proposições, então proposições são apenas ficções uteis que nós utilizamos para descrever os estados de crença das pessoas, e o chão é limpo por baixo de quaisquer objeções formuladas com base em suposições platonistas quanto à realidade de proposições. Finalmente, são possíveis definições adequadas da onisciência divina que não fazem absolutamente nenhuma menção de proposições. Charles Taliaferro propõe, por exemplo, que a onisciência seja entendida em termos de poder cognitivo máximo, ou seja, uma pessoa S é onisciente se e somente se é metafisicamente impossível que exista algum ser com maior poder cognitivo que S e esse poder for completamente exercido.

Até agora, longe de debilitar o teísmo, as criticas anti-teístas da coerência do teísmo serviram principalmente pare refinar e fortalecer a crença teísta.

Problema do mal. Sem dúvida nenhuma o maior obstáculo para a crença em Deus é o assim chamado problema do mal. Durante aproximadamente o último quarto de século, uma enorme quantidade de análise filosófica foi dedicada a esse problema, e como resultado verdadeiro progresso filosófico nessa antiga questão foi feito.

Falando mais amplamente, devemos distinguir entre o problema intelectual do mal e o problema emocional do mal. O problema intelectual do mal diz respeito a como dar uma explicação racional da coexistência de Deus e mal. O problema emocional do mal diz respeito a como confortar aqueles que estão sofrendo e como dissolver o desgosto emocional que as pessoas têm de um Deus que permitiria tal mal.

Pensadores contemporâneos reconhecem que existem versões significativamente diferentes do problema intelectual do mal e têm atribuído diferentes rótulos a eles, como “dedutivo”, “indutivo”, “lógico”, “probabilístico”, “evidencial,” e assim por diante. Pode ser mais útil distinguir duas maneiras nas quais o problema intelectual do mal pode ser utilizado, seja como um problema interno ou como um problema externo. Ou seja, o problema pode ser apresentado em termos de premissas às quais o teísta está ou deve estar comprometido como um teísta, tal que a visão de mundo teísta está em contradição consigo mesma, ou pode ser apresentada em termos de premissas às quais o teísta não está comprometido como um teísta, porém que nós mesmo assim temos bons motivos para aceitar como verdadeiras.

É valoroso notar que ateus tradicionalmente têm apresentado o problema do mal como um problema interno para o teísmo. Isto é, ateus têm argumentado que as afirmações

A. Um Deus onipotente e onibenevolente existe.

e

B. A quantidade e tipos de sofrimento no mundo existem.

são ou logicamente inconsistentes ou improváveis em relação uma à outra. Como resultado do trabalho de filósofos cristãos como Alvin Plantinga, é hoje em dia reconhecido que o problema interno do mal é um fracasso como um argumento para o ateísmo. Ninguém nunca foi capaz de demonstrar que (A) e (B) são ou logicamente incompatíveis uma com a outra ou improváveis em relação uma à outra.

Tendo abandonado o problema interno, ateístas passaram, bem recentemente, a advogar o problema externo, muitas vezes chamado de problema evidencial do mal. Se nós tomamos Deus como essencialmente onipotente e onibenevolente, e chamamos o sofrimento que não é necessário para atingir algum bom adequadamente compensador de “mal gratuito”, o argumento pode ser simplesmente resumido:

1.  Se Deus existe, o mal gratuito não existe.

2. Mal gratuito existe.

3. Portanto, Deus não existe.

O que torna esse um problema externo é que o teísta não está comprometido, graças à sua visão do mundo, à verdade de (2). O teísta cristão está comprometido com a verdade de que O mal existe, mas não que Mal gratuito existe. Por isso, o ateu afirma que o sofrimento aparentemente sem sentido e desnecessário no mundo constitui evidência contra a existência de Deus.

Bem, a premissa mais controversa nesse argumento é (2). Todo mundo admite que o mundo está cheio de sofrimento aparentemente gratuito. Porém, isso não quer dizer que esses males aparentemente gratuitos são gratuitos. Existem pelo menos três razões por que a inferência do mal genuinamente gratuito a partir do mal aparentemente gratuito é ténue.

1. Nós não estamos em uma boa posição para saber com confiança a probabilidade de Deus não ter razões moralmente suficientes para permitir o sofrimento no mundo. O fato da existência de Deus ser improvável relativamente ao mal no mundo depende de quão provável é que Deus tenha razões moralmente suficientes para permitir o mal que ocorre. O que torna essa probabilidade tão difícil de julgar é que nós não estamos em uma boa posição epistêmica para fazer esse tipo de julgamento probabilístico com qualquer tipo de confiança. Apenas uma mente onisciente poderia compreender as complexidades de providencialmente direcionar um mundo de criaturas livres rumo à objetivos pré-envisionados.  É preciso apenas pensar sobre as contingências inumeráveis, incalculáveis, envolvidas com o acontecimento de um único evento histórico – por exemplo, a promulgação da política de Lend-Lease [Empréstimo e Arrendamento] pelo Congresso Americano antes da entrada dos Estados Unidos na II Guerra Mundial. Nós não temos nenhuma ideia dos males morais e naturais que podem estar envolvidos para que Deus possa organizar as circunstâncias e agentes livres necessários a um evento como esse. Dizer isso não é apelar ao mistério, porém apontar para as inerentes limitações cognitivas que frustram tentativas de dizer que é improvável que Deus tenha uma razão moralmente suficiente para permitir algum mal em particular.

Ironicamente, em outros contextos, ateus reconhecem essas limitações cognitivas. Uma das objeções mais prejudiciais à teoria ética utilitária, por exemplo, é que é simplesmente impossível para nós estimar que ação que possamos realizar levará, ultimamente, à maior quantidade de felicidade e prazer no mundo. Graças à nossas limitações cognitivas, ações que parecem desastrosas em curto termo podem resultar no maior bem, enquanto algum benefício de curto termo pode causar miséria indizível. Uma vez que contemplamos a providência de Deus ao longo da totalidade da história, então se torna evidente quão sem esperança é para nós, observadores limitados, especular sobre a probabilidade de que algum mal que vemos ser ultimamente gratuito. Nossa falha em discernir a razão moralmente justificante para a ocorrência de vários males dá muito pouca base para pensar que Deus – especialmente um Deus equipado com conhecimento médio – não tem razões moralmente suficientes para permitir os males que nós observamos no mundo.

2. O teísmo Cristão implica em doutrinas que aumentam a probabilidade da coexistência de Deus e mal. O ateísta mantém que, se Deus existe, então é improvável que o mundo fosse conter os males que contém. Agora, o que o teísta Cristão pode fazer em reposta a tal declaração é oferecer várias hipóteses que tenderiam a aumentar a probabilidade do mal dada a existência de Deus: Pr (Mal/Deus&Hipótese) > Pr (Mal/Deus). O cristão pode tentar mostrar que, se Deus existe e essas hipóteses são verdadeiras, então não é tão surpreendente que o mal exista. Essas hipóteses são várias doutrinas cristãs, tal que a afirmação do Cristão de que o mal observado no mundo é mais provável no teísmo Cristão do que no mero teísmo (ou, alternativamente, que essas doutrinas deveriam nos levar a rever Pr (Mal/Deus) para cima à luz da realização de que Pr (Mal/Deus Cristão) não é tão baixa, afinal). Quatro doutrinas cristãs vêm a mente nessa conexão.

Primeiro, o principal propósito da existência humana não é a felicidade, mas o conhecimento de Deus. Uma razão pela qual o problema do mal parece tão intrigante é que nós tendemos a pensar que se Deus existe, então Seu objetivo para a vida humana é felicidade nesse mundo. O papel de Deus é prover um ambiente confortável para seus bichinhos humanos. Mas, na visão Cristã, isso é falso. Nós não somos os bichinhos de Deus, e o fim do homem não é felicidade nesse mundo, mas o conhecimento de Deus – que ultimamente trará a verdadeira e eterna realização humana. Muitos males ocorrem na vida que podem ser totalmente inúteis à meta de produzir felicidade humana nesse mundo, mas eles podem não ser inúteis em relação a produzir o conhecimento de Deus. Para prosseguir com seu argumento, o ateu deve mostrar que é factível para Deus criar um mundo no qual o mesmo conhecimento de Deus é alcançado, porém com muito menos mal – o que é pura especulação.

Segundo, à humanidade foi concedida liberdade moral significativa para se rebelar contra Deus e seu propósito. Em vez de se submeter e adorar a Deus, as pessoas se rebelam contra Deus e seguem seus próprios caminhos, e, com isso, se acham alienados de Deus, moralmente culpados perante Ele, e tateando nas trevas espirituais, perseguindo falsos deuses de sua própria criação. Os terríveis males humanos no mundo são testemunhas à depravação do homem nesse estado de alienação espiritual de Deus.

Terceiro, o conhecimento de Deus deságua na vida eterna. Na visão Cristã, essa vida terrena é apenas uma preparação momentânea para a vida imortal. Na vida após a morte Deus dará àqueles que confiaram Nele para a salvação uma vida eterna de alegria indizível. Dada a perspectiva de vida eterna, não deveríamos esperar ver, nessa vida, a compensação de Deus por todo mal que experimentamos. Alguns podem ser justificados somente à luz da eternidade.

Quarto, o conhecimento de Deus é um bem incomensurável. Conhecer Deus, a fonte de infinita bondade e amor, é um bem incomparável, a realização da existência humana. Os sofrimentos dessa vida não podem nem ao menos ser comparados a isso. Portanto, a pessoa que conhece Deus, não importa o que ela sofra, não importa quão terrível seja sua dor, ainda pode dizer, com sinceridade, que “Deus é bom pra mim”, simplesmente em virtude do fato de que ele conhece Deus.

Essas quatro doutrinas Cristãs aumentam a probabilidade da coexistência de Deus e dos males do mundo. Elas, portanto, servem para diminuir qualquer improbabilidade que esses males podem parecer impor sobre a existência de Deus. Para sustentar seu argumento, o ateu terá que mostrar que essas doutrinas são, elas mesmas, improváveis.

3. Há mais fundamentação para acreditar que Deus existe do que que o mal no mundo é realmente gratuito. Foi dito que o modus ponens de um homem é o modus tollens de outro. O próprio argumento do ateu, portanto, pode ser virado contra ele:

1. Se deus existe, o mal gratuito não existe

2*. Deus existe.

3*. Portanto, o mal gratuito não existe.

Portanto, se Deus existe, então o mal no mundo não é realmente gratuito.

Então a questão é quem é verdade: (2) ou (*2)? Para provar que Deus não existe, ateus teriam que mostrar que (2) é significantemente mais provável que (2*). Como Daniel Howard-Snyder nota em seu livro The Evidential Problem of Evil [O Problema Evidencial do Mal], um argumento a partir do mal é um problema apenas para a pessoa “que acha todas suas premissas e inferências convincentes e que tem fundamentos ruins para acreditar no teísmo”.7 Mas, se alguém tem razões melhores para acreditar que Deus existe, então o mal “não é um problema.”8  O teísta Cristão deve manter que, quando levamos em conta todo o escopo da evidência, então a existência de Deus se torna bem provável, mesmo se o problema do mal, tomado isoladamente, torne a existência de Deus improvável.

Argumentos Convincentes em favor do Teísmo

O renascimento da filosofia Cristã ao longo do último meio século tem sido acompanhado por uma reapreciação dos argumentos tradicionais para a existência de Deus. Limitações de espaço permitem a menção de apenas quatro tais argumentos aqui.

Argumento da Contingência. Uma afirmação simples do argumento pode prosseguir assim:

1. Qualquer coisa que exista tem uma explicação de sua existência (seja na necessidade de sua própria natureza ou em uma causa externa).

2. Se o universo tem uma explicação de sua existência, essa explicação é Deus.

3. O universo existe.

4. Portanto, a explicação da existência do universo é Deus.

A premissa (1) é uma versão modesta do Princípio da Razão Suficiente. Ela contorna as objeções ateístas típicas a versões fortes desse princípio. Porque (1) requer apenas que qualquer coisa existente tenha uma explicação de sua existência. Essa premissa é compatível com a existência de fatos brutos sobre o mundo. O que ela impede é que possam haver coisas que simplesmente existem inexplicavelmente. Esse princípio parece bem plausível, pelo menos mais que seu oposto. Vêm à mente a ilustração de Richard Taylor de achar uma bola translúcida ao caminhar na floresta. Achar-se-ia muito estranha a afirmação bizarra de que a bola simplesmente existe inexplicavelmente; e aumentar o tamanho da bola, mesmo até ela se tornar coextensiva com o cosmos, não faria nada para removar a necessidade de uma explicação de sua existência.

A premissa (2) é, em efeito, a contrapositiva da típica resposta ateísta de que, na visão de mundo ateia, o universo simplesmente existe como uma coisa bruta contingente. Além disso, (2) parece bem plausível por si só. Pois se o universo, por definição, inclui toda a realidade física, então a causa do universo deve (pelo menos causalmente antes da existência do universo) transcender o espaço e o tempo e, portanto, não pode ser temporal ou material. Porém, existem apenas dois tipos de coisas que poderiam se adequar a essa definição: ou um objeto abstrato ou, então, uma mente. Mas objetos abstratos não se encontram em relações causais. Portanto, segue-se que a explicação do universo é uma causa externa, transcendente, pessoal – o que é um dos significados de “Deus”.

Por fim, (3) afirma o óbvio – que há um universo. Segue-se que Deus existe.

Está aberto ao ateísta replicar que, embora o universo tenha uma explicação desua existência, essa explicação não se encontra em um fundamento externo, mas na necessidade de sua própria natureza; em outras palavras, (2) é falso. Esta é, porém, uma afirmação extremamente atrevida, que ateus não têm sido ávidos para abraçar. Nós temos, pode-se afirmar seguramente, uma intuição forte da contingência do universo. Um mundo possível em que nenhum objeto concreto exista parece certamente concebível. Nós geralmente confiamos em nossas intuições modais em relação a outros assuntos familiares; se formos fazer o contrário em respeito à contingência do universo, então o ateu precisa providenciar alguma razão para tal ceticismo além de sua vontade de evitar o teísmo. Além disso, como veremos abaixo, nós temos boas razões para pensar que o universo não existe por uma necessidade de sua própria natureza.

Argumento Cosmológico. Uma versão simples do argumento pode seguir de tal forma:

1. Tudo que passa a existir tem uma causa.

2. O universo passou a existir.

3. Portanto, o universo tem uma causa.

A análise conceitual do que significa ser a causa do universo, então, ajuda a estabelecer algumas das propriedades teologicamente significantes desse ser.

A premissa (1) parece obviamente verdadeira – pelo menos, mais do que sua negação. Ela está fundamentada na intuição metafísica de que algo não pode vir a existir a partir de nada. Se coisas pudessem realmente passar a existir a partir de nada, então se torna inexplicável porque simplesmente tudo e qualquer coisa não passam a existir não causados a partir do nada. Além disso, a convicção de que uma origem do universo requer uma explicação causal parece bem razoável, pois na visão ateísta, se o universo começou no Big Bang, então não havia nem a potencialidade da existência do universo antes do Big Bang, já que nada é anterior ao Big Bang. Mas, então, como poderia o universo se tornar real, se não havia sequer a potencialidade da sua existência? Faz muito mais sentido dizer que a potencialidade do universo reside no poder de Deus para cria-lo. Finalmente, a primeira premissa é constantemente confirmada em nossa experiência. Ateístas que são naturalistas científicos, assim, tem a mais forte das motivações para aceita-la.

A premissa (2), a premissa mais controversa, pode ser apoiada tanto por argumentos dedutivos, filosóficos, como por argumentos indutivos, científicos. Proponentes clássicos do argumento alegaram que um regresso temporal infinito de eventos não pode existir, visto que a existência de um número realmente infinito (ao contrário de meramente potencialmente infinito) de coisas leva a absurdidades intoleráveis. A melhor maneira de se apoiar essa afirmação ainda é através de experimentos mentais, como o famoso Hotel de Hilbert9, que ilustra os vários absurdos que resultariam se um infinito real fosse instanciado no mundo real. É usualmente alegado que esse tipo de argumento foi invalidado pelo trabalho de Georg Cantor sobre o infinito real. Mas a teoria dos conjuntos Cantoriana pode ser interpretada como sendo simplesmente um universo do discurso, um sistema matemático baseado em certos axiomas e convenções adotados. O defensor do argumento pode manter que, embora o infinito real possa ser um conceito consistente e frutífero no universo postulado do discurso, ele não pode ser transposto para o mundo espaço-temporal, pois isso envolveria absurdos contraintuitivos. Ele é livre para rejeitar visões Platonistas dos objetos matemáticos em favor de visões não platonistas, como o ficcionalismo ou o conceitualismo divino combinado com a simplicidade da cognição de Deus.

Um segundo argumento para o início do universo oferecido por proponentes clássicos é que séries temporais de eventos passados não podem ser um infinito real, pois uma coleção formada por adição sucessiva não pode ser realmente infinita. Para que nós possamos ter “chegado” no hoje, a existência temporal atravessou (por assim dizer) um número infinito de eventos anteriores. Porém, antes que o presente chegar, o evento imediatamente anterior a ele teria que chegar; e antes que esse evento pudesse chegar, o evento imediatamente anterior a ele teria que chegar; e assim por diante ad infinitum. Nenhum evento poderia chegar, já que antes que ele pudesse decorrer, sempre haverá mais um evento que precisa ter acontecido antes. Dessa forma, se a série de eventos passados não tivesse inicio, o presente não poderia ter chegado, o que é absurdo.

É frequentemente objetado que esse tipo de argumento ilicitamente pressupõe um ponto inicial infinitamente distante no passado e então pronúncia como impossível viajar desse ponto até hoje, enquanto na verdade, para qualquer dado ponto no passado, há apenas uma distância finita ao presente, que é facilmente atravessada. Mas proponentes do argumento, na verdade, não assumiram que havia um ponto inicial infinitamente distante no passado.

Atravessar uma distância é cruzar toda parte adequada da mesma. Dessa forma, travessia não implica que a distância atravessada tem um ponto inicial ou final ou uma parte inicial ou final. O fato de que não há nenhum inicio sequer, nem mesmo um infinitamente distante, parece apenas tornar o problema pior, não melhor. Dizer que o passado infinito pode ter sido formado por adição sucessiva é como dizer que alguém acabou de ter sucesso em escrever todos os números negativos, terminando em -1. E, podemos perguntar, como a afirmação de que a partir de qualquer dado momento no passado há apenas uma distância finita ao presente sequer relevante ao assunto? Afinal, a questão é como a série inteira pode ser formada, não uma porção finita dela. Pensar que, já que todo segmento finito de uma série pode ser formado por adição sucessiva, toda a série infinita também pode, é cometer a falácia da composição.

Um terceiro argumento para o começo do universo é um argumento indutivo baseado na evidência contemporânea para a expansão do universo. O modelo padrão do Big Bang não descreve a expansão do conteúdo material do universo em um espaço pré-existente, vazio, mas, ao contrário, a expansão do próprio espaço. Isso tem a implicação surpreendente de que, conforme se extrapola de volta no tempo, a curvatura do espaço-tempo se torna progressivamente maior, até que se chega em uma singularidade, na qual a curvatura do espaço-tempo se torna infinita. Constitui, portanto, uma borda ou limite ao próprio espaço-tempo.

A história da cosmologia do século XX tem, em um sentido, sido uma série de tentativas falhas de elaborar modelos não-padrão aceitáveis do universo em expansão, a fim de evitar o início absoluto previsto pelo modelo padrão. Embora tais teorias sejam possíveis, o veredito esmagador da comunidade científica tem sido que nenhuma delas é mais provável que a teoria do Big Bang. Não há modelo matematicamente consistente que tenha sido tão bem sucedido em suas predições ou tão corroborado pela evidência como a teoria tradicional do Big Bang. Por exemplo, algumas teorias, como o Universo Oscilatório (que se expande e re-contrai para sempre) ou o Universo Inflacionário Caótico (que continuamente gera novos universos), de fato tem um futuro potencialmente infinito, mas acabam tendo apenas um passado finito. Teorias do Universo como Flutuação do Vácuo (que postulam um vácuo eterno do qual nosso universo nasce) não podem explicar porque, se o vácuo era eterno, nós não observamos um universo infinitamente velho. A proposta do Universo Sem Fronteiras de Hartle e Hawking, se interpretada realisticamente, continua envolvendo uma origem absoluta do universo, mesmo que o universo não comece em uma singularidade, como na teoria padrão do Big Bang. Cenários recentemente propostos de um Universo Cíclico Ekpirótico, baseados na teoria das cordas ou na teoria-M, também foram demonstrados como, não apenas recheados de problemas, mas, mais significantemente, implicando a própria origem do universo que seus proponentes procuravam evitar.  É claro, resultados científicos são sempre provisionais, mas não há dúvidas de que alguém se encontra confortavelmente dentro do mainstream científico ao afirmar a veracidade da premissa (2).

Um quarto argumento para a finitude do passado é, também, um argumento indutivo, apelando para as propriedades termodinâmicas do universo. De acordo com a Segunda lei da Termodinâmica, processos ocorrendo dentro de um sistema fechado tendem a estados de maior entropia a medida que sua energia é usada. Já no século dezenove alguns cientistas perceberam que a aplicação da Lei ao universo como um todo (o qual, em pressupostos naturalistas, é um sistema fechado gigante, já que é tudo que existe) implicava numa conclusão escatológica sombria: dado tempo o suficiente, o universo iria, eventualmente, chegar a um estado de equilíbrio e sofrer morte térmica. Mas essa projeção aparentemente firme suscitou uma pergunta ainda mais profunda: se, dado tempo suficiente, o universo vai sofrer morte térmica, então por que, se sempre existiu, ele não está, nesse momento, em um estado de morte térmica? O advento da teoria da relatividade alterou a forma do cenário escatológico predito com base na Segunda Lei, mas não afetou substancialmente essa questão fundamental. A evidência astrofísica indica, esmagadoramente, que o universo vai se expandir para sempre. Enquanto o faz, ele se tornará cada vez mais frio, sombrio, diluído e morto. Eventualmente, toda a massa do universo será apenas um gás frio e fino de partículas elementares e radiação, cada vez mais diluído à medida que se expande rumo à escuridão infinita – um universo em ruínas.

Mas isso levanta a pergunta: se em uma quantidade finita de tempo o universo vai alcançar um estado frio, sombrio, diluído e sem vida, então por que, se existe há tempo infinito, ele não está, agora,em tal estado? Para evitar a conclusão de que o universo, de fato, não existe desde sempre, então se deve encontrar alguma maneira cientificamente plausível de revogar os achados da cosmologia física, de modo a permitir que o universo retorne à sua condição juvenil. Porém, nenhum cenário realista e plausível é iminente.10 A maioria dos cosmólogos concordamcom o físico P. C. W. Davies que, gostemos ou não, nós parecemos obrigados a concluir que a condição de baixa entropia do universo foi simplesmente “posta” como uma condição inicial no momento da criação.11

Temos, portanto, boas bases filosóficas e científicas para afirmar a segunda premissa do argumento cosmológico. É notável que essa premissa é uma afirmação religiosamente neutra, a qual pode ser encontrada em qualquer livro sobre cosmologia astrofísica, de tal forma que acusações simplistas de teologia “Deus-das-lacunas” não encontram nenhum valor. Além disso, como um ser que existe por uma necessidade de sua própria natureza deve existir ou atemporalmente ou sempiternamente (de outro modo, seu passar a existir ou cessar de ser tornaria evidente que sua existência não é necessária), prossegue que o universo não pode ser metafisicamente necessário, fato que fecha a saída final no argumento da contingência acima.

Se segue logicamente que o universo tem uma causa. Análise conceitual de quais propriedades devem ser possuídas por tal causa extramundana nos permitem recuperar uma quantidade impressionante dos atributos divinos tradicionais, revelando que, se o universo tem uma causa, então um Criador pessoal e não causado do universo existe, o qual sem o universo é sem inicio, imutável, imaterial, atemporal, não espacial e extremamente poderoso.12

Argumento Teleológico. Nós podemos formular um argumento de design como a seguir:

1. O ajuste-fino do universo deve-se à necessidade física, acaso ou desígnio.

2. Não se deve à necessidade física nem ao acaso.

3. Logo, é devido a desígnio.

O que significa “ajuste-fino”? As leis físicas do universo, quando dadas expressão matemática, contêm várias constantes, como a constante gravitacional, cujos valores são independentes das leis em si; além disso, há certas quantidades arbitrárias que estão simplesmente postas como condições limites nas quais o as leis do universo devem operar – por exemplo, a condição inicial de baixa entropia do universo. Por “ajuste-fino” se entende que os valores reais assumidos pelas constantes e quantidades em questão são tais que pequenos desvios em relação a esses valores tornariam o universo desfavorável à vida, ou, alternativamente, que a faixa de valores que permitem a vida é incompreensivelmente estreita em comparação à faixa de valores que podem ser assumidos.

Leigos podem pensar que, se as constantes tivessem assumido valores diferentes, então outras formas de vida poderiam muito bem ter evoluído. Mas esse não é o caso. Por “vida” os cientistas se referem àquela propriedade dos organismos de obter comida, extrair energia dela, crescer, se adaptar ao seu ambiente e se reproduzir. O ponto é que, para que o universo possa permitir a vida assim-definida, qualquer que seja a forma que esses organismos possam ter, as constantes e quantidades devem ser incompreensivelmente bem ajustadas. Na ausência de ajuste-fino, nem mesmo matéria ou química existiria, para não mencionar planetas onde a vida possa evoluir.

Objetou-se que, em universos governados por leis da natureza diferentes, tais consequências deletérias poderiam não resultar da variação dos valores das constantes e quantidades. O teleólogo não precisa negar essa possibilidade. Tudo que ele precisa mostrar é que, entre possíveis universos governados pelas mesmas leis (mas tendo valores diferentes para as constantes e quantidades) que o universo real, aqueles favoráveis à vida são extraordinariamente improváveis.

Agora, a premissa (1) estabelece as três alternativas viáveis no pool de opções para explicar o ajuste-fino cósmico. A pergunta é qual é a melhor explicação.

À primeira vista, a alternativa da necessidade física parece extraordinariamente implausível. Como vimos, os valores das constantes e quantidades físicas são independentes das leis da natureza. Se a matéria e anti-matéria primordiais fossem proporcionadas diferentemente, se o universo tivesse expandido apenas um pouco mais lentamente, se a entropia do universo fosse marginalmente maior; qualquer um desses ajustes (e mais) teriam prevenido um universo que permite a vida, porém todos eles parecem perfeitamente possíveis, fisicamente. A pessoa que mantém que o universo tem que permitir a vida está adotando uma postura radical que requer provas fortes. Mas até agora não há nenhuma; essa alternativa é avançada como uma mera possibilidade.

Às vezes os físicos, de fato, falam sobre uma ainda não descoberta Teoria de Tudo (T.D.T), mas tal nomenclatura é, como muitos dos coloridos nomes dados à teorias científicas, bem enganoso. Uma T.D.T., na verdade, tem o objetivo limitado de providenciar uma teoria unificada das quatro forças fundamentais da natureza, mas nem mesmo tentará explicar, literalmente, tudo. Por exemplo: nas candidatas mais promissoras à T.D.T. até hoje, a teoria das supercordas ou a teoria-M, o universo físico precisa ser 11-dimensional, porém o porquê de o universo ter de possuir exatamente esse número de dimensões não é tratado pela teoria. A Teoria-M simplesmente substitui ajuste-fino geométrico por ajuste-fino de forças.

Além disso, parece provável que qualquer tentativa de reduzir significantemente o ajuste-fino acabará ela mesma envolvendo ajuste-fino.  Esse certamente foi o padrão no passado. À luz da especificidade e número de instâncias de ajuste-fino, é improvável que ele desapareça com os próximos avanços da teoria física.

O que, então, da alternativa do acaso? Teleólogos buscam eliminar essa hipótese ou apelando à complexidade especificada do ajuste-fino cósmico (uma abordagem estatística à inferência de desígnio), ou por argumentar que o ajuste-fino é significativamente mais provável na hipótese de desígnio (teísmo) do que na do acaso (ateísmo) (uma abordagem Bayesiana). Comum a ambas as abordagens é a afirmação de que o universo permitir a vida é altamente improvável.

Para salvar a hipótese da chance, defensores dessa alternativa têm cada vez mais recorrido à Hipótese de Muitos Mundos, de acordo com a qual um Conjunto de Mundos de universos concretos existe, dessa forma multiplicando seus recursos probabilísticos.  Para garantir que, graças apenas ao acaso, um universo como o nosso aparecerá em algum lugar no Conjunto, um número realmente infinito de universos é normalmente postulado. Mas isso não é o bastante; também é preciso estipular que esses mundos são randomicamente organizados em relação aos valores de suas constantes e quantidades, para que eles não sejam de variedade insuficiente para incluir um universo que permita a vida.

É a Hipótese de Muitos Mundos uma explicação tão boa como a Hipótese do Design?

Isso parece duvidoso. Em primeiro lugar, como uma hipótese metafísica, a Hipótese de Muitos Mundos é discutivelmente inferior a Hipótese de Design, pois a última é mais simples. De acordo com a Navalha de Ockham, nós não deveríamos multiplicar causas além do que é necessário para explicar o efeito. Mas é mais simples postular um Inventor Cósmico para explicar o nosso universo do que postular a ontologia infinitamente inchada e forçada da Hipótese de Muitos Mundos. Só se o teorista de Muitos Mundos conseguisse mostrar que há um mecanismo único, comparativamente simples, para gerar um Conjunto de Mundos de universos randomicamente variados, ele seria capaz de evitar essa dificuldade.

Segundo, não há nenhuma maneira conhecida de se gerar um Conjunto de Mundos. Ninguém foi capaz de explicar como ou porque tal coleção de universos variados deveria existir. Algumas propostas, como o cenário cósmico evolucionário de Lee Smolin, na verdade, serviram para eliminar universos que permitem a vida, enquanto outras, como o cenário inflacionário caótico de Andre Linde, terminaram por precisar de ajuste-fino eles mesmos.

Terceiro, não há evidencial para a existência de um Conjunto de Mundos à parte do próprio ajuste-fino. Mas o ajuste-fino é, igualmente, evidência para um Inventor Cósmico. De fato, a hipótese de um Inventor Cósmico é mais uma vez a melhor explicação, pois nós temos evidências independentes para a existência de tal ser nos outros argumentos teístas.

Quarto, se nosso universo é apenas um membro de um Conjunto de Mundos infinito de universos randomicamente variados, então é esmagadoramente mais provável que nós devêssemos estar observando um universo muito diferente do que o que de fato observamos. Roger Penrose calcula que as chances da condição de baixa entropia do nosso universo serem obtidas por apenas chance são da ordem de 1:1010(123), um número inconcebivelmente pequeno. Em contraste, as chances de o nosso sistema solar ser formado instantaneamente por colisões aleatórias de partículas é, de acordo com Penrose, cerca de 1:1010(60) – um número grande, mas inconcebivelmente maior que 1010(123). Se nosso universo fosse apenas mais um membro de uma coleção de mundos aleatoriamente ordenados, então é vastamente mais provável eu nós devêssemos estar observando um universo bem menor. Adotar a Hipótese dos Muitos Mundos para explicar o ajuste-fino, portanto, resulta em um ilusionismo bizarro: é bem mais provável que todas nossas estimativas astronômicas, geológicas e biológicas de idade estejam erradas e que a aparência do nosso largo e antigo universo seja uma grande ilusão. Ou, novamente, se o nosso universo é apenas um membro de um Conjunto de Mundos, então nós deveríamos estar observando eventos altamente extraordinários, como cavalos entrando e saindo de existência através de colisões aleatórias, ou máquinas de moção perpétua, já que essas coisas são grandemente mais prováveis do que o cair, por chance, de todas as constantes e quantidades da natureza na faixa virtualmente infinitesimal de permissibilidade à vida. Universos observáveis como aqueles são muito mais abundantes no conjunto de universos do que mundos como o nosso e, portanto, deveriam ser observados por nós, caso o universo não fosse nada mais que um membro de um conjunto de mundos. Visto que não temos tais observações, isso fortemente invalida a hipótese do multiverso. Dado o ateísmo, pelo menos, é, portanto, altamente provável que não exista nenhum Conjunto de Mundos. Penrose conclui que explicações antrópicas são tão “impotentes” que é, na verdade, “equivocado” apelar à elas para explicar as características especiais do universo.13 Portanto, a Hipótese de Muitos Mundos falha como uma explicação plausível do ajuste-fino cósmico.

Parece, portanto, que o ajuste fino do universo não é plausivelmente devido nem a necessidade física nem a chance. A não ser que a hipótese de desígnio seja demonstrada como ainda mais implausível que seus competidores, segue-se que o ajuste-fino do universo é devido à desígnio.

Argumento Moral. Teístas tem apresentado uma grande variedade de justificativas morais para acreditar em uma Divindade. Um desses argumentos pode ser formulado como se segue:

1. Se Deus não existe, valores e deveres morais objetivos não existem.

2. Valores e deveres morais objetivos existem.

3. Portanto, Deus existe.

Considere a premissa (1).  Falar de valores e deveres morais objetivos é falar que distinções morais entre o que é bom/mal ou certo/errado são verdadeiras independentemente de qualquer ser humano acreditar nelas. Muitos teístas e ateus concordam que, se Deus não existe, então valores e deveres morais não são objetivos nesse sentido.

Afinal, se Deus não existe, qual é o fundamento dos valores morais? Mais particularmente, qual é a base para o valor de seres humanos? Se Deus não existe, então é difícil ver qualquer razão para pensar que seres humanos são especiais, ou que sua moralidade é objetivamente válida. Além disso, por que pensar que nós temos qualquer obrigação moral de fazer alguma coisa? O quê ou quem impõe quaisquer deveres morais em nós? Como resultado de pressões socio-biológicas, surgiu entre o homo sapiens uma espécie de “moral de rebanho” que funciona bem na perpetuação da nossa espécie na luta pela sobrevivência. Mas não parece haver nada sobre o homo sapiens que faça essa moralidade objetivamente obrigatória. Se o filme da história evolucionária fosse rebobinado e filmado novamente, criaturas bem diferentes com um conjunto de valores bem diferentes poderiam muito bem ter evoluído. Com que direito nós consideramos nossa moralidade como objetiva, e não a deles? Como o filósofo humanistas Paul Kurtz põe: “A pergunta central sobre princípios morais e éticos diz respeito à seus fundamentos ontológicos. Se eles não são nem derivados de Deus nem ancorados em algum fundamento transcendente, são eles meramente efêmeros?”14

Alguns filósofos, tão avessos a valores morais transcendentalmente existentes quanto ao teísmo, tentam manter a existência de princípios morais objetivos ou propriedades morais supervenientes no contexto de uma visão de mundo naturalista. Porém, os defensores de tais teorias tipicamente não conseguem justificar seu ponto inicial. Se não há nenhum Deus, então é difícil ver qualquer razão para pensar que a moralidade de rebanho evoluída pelo homo sapiens é objetivamente verdadeira, ou que a bondade moral sobrevém em certos estados naturais de tais criaturas. Pondo cruamente, na visão ateísta os humanos são apenas animais; e animais não são agentes morais.

Se nossa abordagem à teoria meta-ética for ser metafísica séria, e não somente uma abordagem “lista de compras”, na qual alguém simplesmente se ajuda até os princípios ou propriedades morais supervenientes necessários para o trabalho, então alguma espécie de explicação é requerida de porque propriedades morais sobrevêm em certos estados naturais, ou porque tais princípios são verdadeiros.15 É insuficiente para o naturalista mostrar que nós, de fato, apreendemos a bondade de alguma característica da existência humana, pois isso serve somente para estabelecer a objetividade de valores e deveres morais, o que é meramente a premissa (2) do argumento moral.

Nós, portanto, precisamos perguntar se valores e deveres morais podem ser plausivelmente ancorados em algum fundamento transcendente não-teísta. Chamemos essa visão de Realismo Moral Ateísta. Realistas morais ateístas afirmam que valores e deveres morais objetivos de fato existem e não dependem da evolução ou da opinião humana, porém insistem que eles não se fundamentam em Deus. De fato, valores morais não tem nenhum outro fundamento. Eles simplesmente existem.

É difícil, porém, sequer compreender essa posição. O que significa dizer, por exemplo, que o valor moral Justiça simplesmente existe? É difícil saber o que fazer disso. É claro o se quer dizer quando é dito que uma pessoa é justa; porém, é desconcertante quando se diz que, na ausência de quaisquer pessoas, a Justiça em si existe.

Segundo, a natureza da obrigação moral parece incompatível com o Realismo Moral Ateísta. Suponha que valores como Misericórdia, Justiça, Paciência e afins simplesmente existem. Como isso resulta em quaisquer obrigações morais para mim? Por que eu teria um dever moral de, por exemplo, ser misericordioso? O que ou quem impõe tal obrigação em mim? Nessa visão, vícios morais como Ganância, Ódio e Egoísmo também, presumivelmente, existem como objetos abstratos. Por que eu sou obrigado a alinhar minha vida com um conjunto desses objetos abstratamente existentes, e não outro? Em contraste com o ateu, o teísta pode dar sentido à obrigação moral, pois os comandos de Deus podem ser vistos como constituintes de nossos deveres morais.

Em terceiro lugar, é fantasticamente improvável que exatamente esse tipo de criaturas as quais correspondem ao domínio abstratamente existente dos valores morais fossem emergir do cego processo evolutivo. Essa parece ser uma coincidência completamente incrível quando se pensa nela. É quase como se o domínio moral soubesse que nós estávamos vindo. É bem mais plausível considerar tanto o domínio natural quanto o moral como sob a hegemonia de um Criador e Legislador divino do que pensar que essas ordens da realidade inteiramente independentes simplesmente se engrenaram, ao acaso.

Embora meta-éticas teístas assumam uma rica variedade de formas, está havendo nos últimos anos uma ressurgência de interesse na Moralidade de Comando Divino, que entende nossos deveres morais como nossas obrigações a Deus à luz de Seus comandos morais – por exemplo: “Ame o próximo como a si mesmo”, e assim por diante. Nossos deveres morais são constituídos pelos comandos de um Deus imparcial e amoroso. Pra qualquer ação A e agente moral S, podemos explicar as noções de requerimento moral, permissão e proibição de A para S:

A é requerido de S se e somente se um Deus imparcial e amoroso comanda S a fazer A.

A é permitido para S se e somente se um Deus imparcial e amoroso não comanda S a não fazer A.

A é proibido para S se e somente se um Deus imparcial e amoroso comanda S a não fazer A.

Como nossos deveres morais são baseados nos comandos divinos, eles não são independentes de Deus, nem é Deus sujeito a deveres morais, visto que Ele não emite comandos para Si mesmo. Também não são os comandos de Deus arbitrários, visto que eles são expressões necessárias de Sua natureza.

Pode ser perguntado por que a natureza de Deus deve ser compreendida como definitiva da verdade. Porém, a não ser que sejamos niilistas, temo que reconhecer algum padrão definitivo de valor, e Deus parece ser o ponto de parada menos arbitrário. Além disso, a natureza de Deus é singularmente apropriada para servir como tal padrão. Pois, por definição, Deus é o maior ser concebível, e é mais grandioso ser o paradigma do valor moral do que meramente se conformar a tal padrão. Mais especificamente, Deus é, por definição, digno de adoração. E apenas um ser que é a fonte e origem de todo valor é digno de adoração.

Argumentos tradicionais para a existência de Deus como os acima, para não mencionar criativos novos argumentos, estão vivos e bem no cenário contemporâneo na filosofia Anglo-Americana. Juntamente com a falha de argumentos anti-teístas, eles ajudam a explicar o renascimento de interesse no teísmo.

Notas

1 Paul Benacerraf, “What Mathematical Truth Could Not Be—I,” em Benacerraf and His Critics, ed. Adam Morton e Stephen P. Stich (Oxford: Blackwell: 1996), p. 18.

2 A mudança não passou despercebida nem na cultura popular. Em 1980 a revista Time publicou uma grande história titulada “Modernizando o Caso para Deus”, na qual era descrito o movimento entre filósofos contemporâneos para renovar os argumentos tradicionais para a existência de Deus. A Time se maravilhava: “Em uma revolução silenciosa em pensamento e argumento que quase ninguém poderia ter previsto apenas duas décadas atrás, Deus está contra-atacando. Mais intrigantemente, isso está acontecendo não entre teólogos ou crentes comuns, mas no meio de círculos intelectuais de filósofos acadêmicos, onde o consenso há muito havia banido o Todo-Poderoso do discurso frutífero” (“Modernizando o Caso para Deus,” Time [7 de Abril de 1980], pp. 65-66). O artigo cita o falecido Roderick Crisholm para efeito de que a razão pela qual o ateísmo era tão influente uma geração atrás era que os filósofos mais brilhantes eram ateus; mas hoje, na opinião dele, muitos dos filósofos mais brilhantes são teístas, usando um intelectualismo determinado em defesa daquela crença que, anteriormente, estava faltando em seu lado do debate.

3 Quentin Smith, “The Metaphilosophy of Naturalism” Philo 4/2(2001): 3-4. Um sinal dos tempos: A própria Philo, incapaz de obter sucesso como um órgão secular, hoje se tornou um jornal para filosofia da religião em geral.

4 Ibid., p. 4.

5 Um dos avanços mais significativos na Epistemologia Religiosa contemporânea foi a assim-chamada Epistemologia reformada, encabeçada e desenvolvida por Alvin Plantinga, que diretamente ataca o construto evidencialista da racionalidade. Em relação à crença de que Deus existe, Plantinga mantém que Deus nos constituiu de tal forma que nós naturalmente formamos essa crença sob certas circunstâncias; como a crença é, então, formada por faculdades cognitivas funcionando apropriadamente em um ambiente apropriado, ela nos é justificada, e, na medida em que nossas faculdades cognitivas não estejam interrompidas pelos efeitos noéticos do pecado, nós iremos acreditar nessa proposição profunda e firmemente, de modo que se pode dizer que, em virtude da grande certeza resultante desta crença para nós, sabemos que Deus existe.

6 Sobre a ressurreição de Jesus, veja N.T. Wright, Christian Origins and the Question of God, vol.3: The Ressurrection of the Son of God (Minneapolis: Fortress Press, 2003).

7 Daniel Howard-Snyder, “Introduction,” em The Evidential Argument from Evil, ed. Daniel Howard-Snyder (Bloomington, Ind.: Indiana University Press, 1996), p. xi.

8 Ibid. O teísta Cristão irá, portanto, insistir que, ao tratar do problema externo do mal, consideremos não só o problema do mal no mundo, mas toda a evidência relevante à existência de Deus, incluindo o argumento da contingência para uma Razão Suficiente porque algo existe ao invés de nada, o argumento cosmológico para um Criador do universo, o argumento teleológico para um Projetista inteligente do cosmos, o argumento axiológico para um Bem derradeiro, pessoalmente incorporado, o argumento não-lógico para uma Mende derradeira, o argumento epistemológico para um Projetista de nossas faculdades cognitivas direcionadas à verdade, o argumento ontológico para um Ser Maximamente Grandioso, assim como a evidência em relação à pessoa de Cristo, a historicidade de sua ressurreição, a existência de milagres e, em adição, experiência existencial e religiosa.

9 A história do Hotel de Hilbert é relatada em George Gamow, One, Two, Three, Infinity (London: Macmillan, 1946), 17.

10 Veja um levantamento de opções em meu “Time, Eternity and Eschatology,” no Oxford Handbook on Eschatology, ed. J. Walls (Oxford: Oxford University Press, vindo em breve).

11 P. C. W. Davies, The Physics of Time Asymmetry (London: Surrey University Press, 1974), p. 104.

12 Veja o argumento em meu “Naturalismo e Cosmologia,” em Analytic Philosophy without Naturalism, ed. A. Corradini, S. Galvan, e J. Lowe (London: Routledge, 2005).

13 Roger Penrose, The Road to Reality (New York: Alfred A. Knopf, 2005), pp. 762-5.

14 Paul Kurtz, Forbidden Fruit (Buffalo, N.Y.: Prometheus Books, 1988), p. 65.

15 Alguns filósofos parecem supor que verdades morais, sendo necessariamente verdadeiras, não podem ter uma explicação de sua veracidade. A pressuposição crucial de que verdades necessárias não podem se manter em relações de prioridade explanatória umas com as outras não é não apenas não evidentemente verdadeira, mas parece claramente falsa. Por exemplo, a proposição Uma pluralidade de pessoas existe é necessariamente verdadeira (em um sentido amplamente lógico) porque Deus existe é necessariamente verdade e Deus é essencialmente uma Trindade. Para dar um exemplo não-teológico: em um relato não-ficcionalista, 2+3=5 é necessariamente verdade, pois os axiomas de Peano para a aritmética padrão são necessariamente verdadeiros. Ou, novamente, Nenhum evento precede a si mesmo é necessariamente verdade, pois O devir temporal é uma característica essencial e objetiva do tempo é necessariamente verdade. Seria altamente implausível sugerir que a relação de prioridade explanatória obtendo entre as proposições relevantes é simétrica.

Artigo Original em inglês: http://www.reasonablefaith.org/theistic-critiques-of-atheism#ixzz24tDNC5oZ

O problema do mal

William Lane Craig

Tradução: teismocristao.wordpress.com

Examina tanto o argumento lógico quanto o probabilístico contra Deus baseados na existência do sofrimento e do mal.

O problema do mal certamente é o maior obstáculo à crença na existência de Deus. Quando eu reflito sobre ambas a extensão e profundidade do sofrimento no mundo, seja devido à inumanidade do homem contra o homem ou desastres naturais, então eu devo confessar que eu acho difícil acreditar que Deus existe. Com certeza muitos de vocês se sentem do mesmo jeito. Talvez devêssemos todos virar ateus.

Mas esse é um passo muito grande para tomar. Como podemos ter certeza de que Deus não existe? Talvez haja uma razão por que Deus permite todo o mal do mundo. Talvez tudo se encaixe no grande esquema das coisas, que nós apenas vagamente podemos discernir, se é que podemos. Como podemos saber?

Como um teísta cristão, eu estou persuadido que o problema do mal, terrível como ele é, não constitui, no fim, uma refutação da existência de Deus. Pelo contrário, na verdade, eu acho que o teísmo cristão é a ultima boa esperança do homem para resolver o problema do mal.

Para poder explicar porque eu me sinto assim, será proveitoso traçar algumas distinções para manter nosso pensamento claro. Primeiramente, nós devemos distinguir entre o problema intelectual do mal e o problema emocional do mal. O problema intelectual do mal diz respeito à como dar uma explicação racional sobre como Deus e o mal podem coexistir. O problema emocional do mal diz respeito a como dissolver o desgosto emocional das pessoas a um Deus que permitiria sofrimento.

Agora vamos olhar, primeiramente, para o problema intelectual do mal. Existem duas versões desse problema: primeiro, o problema lógico do mal, e, segundo, o problema probabilístico do mal.

De acordo com o problema lógico do mal, é logicamente impossível que Deus e o mal coexistam. Como o mal existe, se segue que Deus não existe.

Mas o problema com esse argumente é que não há nenhuma razão para acreditar que Deus e o mal sejam logicamente incompatíveis. Não há nenhuma contradição explicita entre eles. Porém, se o ateu quer dizer que há alguma contradição implícita entre Deus e o mal, então ele deve estar assumindo algumas premissas ocultas que tragam essa contradição implícita. Mas o problema é que nenhum filósofo jamais foi capaz de identificar tais premissas. Portanto, o problema lógico do mal falha em provar qualquer inconsistência entre Deus e o mal.

Porém, mais que isso: nós podemos de fato provar que Deus e o mal são logicamente consistentes. Veja, o ateu pressupões que Deus não pode ter razões moralmente suficientes para permitir o mal no mundo. Porém, essa hipótese não é necessariamente verdadeira. Contanto que seja ao menos possível que Deus tenha razões moralmente suficientes para permitir o mal, segue-se que Deus e o mal são logicamente consistentes.

E, certamente, isso parece pelo menos logicamente possível. Portanto, eu estou muito satisfeito por poder informar que é amplamente aceito entre os filósofos contemporâneos que o problema lógico do mal foi dissolvido. A coexistência de Deus e mal é logicamente possível.

Mas ainda não escapamos do perigo. Pois agora nós nos confrontamos com o problema probabilístico do mal. De acordo com essa versão do problema, a coexistência de Deus e mal é logicamente possível, mas de qualquer maneira é altamente improvável. A extensão e profundidade do mal no mundo são tão grandes que é improvável que Deus pudesse ter razões moralmente suficientes para permiti-lo. Portanto, dado o mal no mundo, é improvável que Deus exista.

Agora, esse é um argumento muito mais poderoso, e, portanto, eu quero focar nossa atenção nele. Em resposta a essa versão do problema do mal, eu quero fazer três pontos principais:

1. Nós não estamos em uma boa posição para avaliar a probabilidade de Deus ter ou não razões moralmente suficientes para os males que ocorrem. Como pessoas finitas, nós somos limitados em tempo, espaço, inteligência e discernimento. Mas o Deus transcendente e soberano vê do inicio ao fim e providencialmente ordena a história de tal maneira que Seus propósitos são ultimamente atingidos através de decisões humanas livres. A fim de atingir os seus fins, Deus pode ter que aturar certos males ao longo do caminho. Males que nos parecem sem sentido dentro de nosso quadro limitado podem ser considerados como tendo sido justamente permitidos dentro do quadro mais amplo de Deus. Para tomar emprestada uma ilustração de um campo em desenvolvimento da ciência, a Teoria do Caos, cientistas descobriram que certos sistemas macroscópicos, por exemplo, sistemas climáticos ou populações de insetos, são extraordinariamente sensíveis às mínimas perturbações. Uma borboleta vibrando em um graveto no Oeste da África poderia pôr em marcha as forças que poderiam eventualmente dar inicio a um furacão sobre o Oceano Atlântico. Mesmo assim, é impossível, em principio, para qualquer pessoa observando aquela borboleta palpitando em um galho, prever tal resultado. O homicídio brutal de um homem inocente ou uma criança morrendo de leucemia poderiam produzir uma espécie de efeito dominó pela história tal que a razão moralmente suficiente de Deus para permitir isso podem não emergir até séculos depois e talvez em outro local. Quando você pensa sobre a providência de Deus sobre a totalidade da história, eu acho que você pode ver quão sem esperança é, para observadores limitados, especular sobre a probabilidade de que Deus possa ter tido razões moralmente suficientes para permitir certo mal. Nós simplesmente não estamos em uma boa condição para avaliar tais probabilidades.

2. A fé Cristã envolve doutrinas que aumentam a probabilidade da coexistência de Deus e mal. Ao fazê-lo, essas doutrinas diminuem qualquer improbabilidade da existência de Deus supostamente surgida a partir da existência do mal. Quais são algumas dessas doutrinas? Deixe-me mencionar quarto:

a. O propósito principal da vida não é felicidade, mas conhecimento de Deus. Uma razão pela qual o problema do mal parece tão intrigante é que nós tendemos a pensar que se Deus existe, então Seu objetivo para a vida humana é felicidade nesse mundo. O papel de Deus é prover um ambiente confortável para seus bichinhos humanos. Mas, na visão Cristã, isso é falso. Nós não somos os bichinhos de Deus, e o fim do homem não é felicidade nesse mundo, mas o conhecimento de Deus, que ultimamente trará verdadeira e eterna realização humana. Muitos males ocorrem na vida que podem ser totalmente inúteis à meta de produzir felicidade humana nesse mundo, mas eles podem não ser injustificados com respeito a produzir o conhecimento de Deus. Sofrimento humano inocente provê uma ocasião para aprofundar a dependência e confiança em Deus, tanto da parte do sofredor ou àqueles ao seu redor. É claro, se o propósito de Deus é alcançado através de nosso sofrimento dependerá de nossa resposta. Reagiremos com raiva e amargura para com Deus, ou nos voltamos a Ele com fé pela força para resistir?

b. A humanidade está em um estado de rebelião contra Deus e Seu propósito. Em vez de se submeter e adorar a Deus, as pessoas se rebelam contra Deus e seguem seus próprios caminhos, e, com isso, se acham alienados de Deus, moralmente culpados perante Ele, e tateando nas trevas espirituais, perseguindo falsos deuses de sua própria criação. Os terríveis males humanos no mundo são testemunhas à depravação do homem nesse estado de alienação espiritual de Deus. O cristão não é surpreendido pelo mal humano no mundo; pelo contrário, ele o espera. A Bíblia diz que Deus deu a humanidade ao pecado que ela escolheu; Ele não intervém para impedi-la, mas deixa a depravação humana seguir seu rumo. Isso só serve para destacar ainda mais a responsabilidade moral da humanidade diante de Deus, assim como a nossa maldade e nossa necessidade de perdão e purificação moral.

c. O conhecimento de Deus deságua na vida eterna. Na visão Cristã, essa vida não é tudo que há. Jesus prometeu vida eterna a todos aqueles que põe sua confiança nele como seu Salvador e Senhor. Na vida após a morte Deus recompensará aqueles que têm suportado o sofrimento com coragem e confiança com uma vida eterna de alegria indizível. O apóstolo Paulo, que escreveu boa parte do Novo Testamento, viveu uma vida de íncrivel sofrimento. Mesmo assim, ele escreveu: “Não desfalecemos. Porque a nossa leve e momentânea tribulação está nos preparando para um peso eterno de glória além de qualquer comparação, porque não nos atentamos nós nas coisas que se veem, mas as que não se veem, porque as que se veem são temporais, e as que não se veem são eternas” (II Cor. 4:16-18). Paulo imagina uma balança, por assim dizer, em que todos os sofrimentos dessa vida são postos em um lado, enquanto do outro lado é colocada a glória que Deus vai outorgar em seus filhos no céu. O peso da glória é tão grande que é literalmente além de qualquer comparação com o sofrimento. Além disso, quanto mais nós ficamos na eternidade, mais os sofrimentos dessa vida diminuem rumo a um momento infinitesimal. É É por isso que Paulo poderia chamá-los de “uma aflição leve e momentânea”, eles foram simplesmente inundados pelo oceano de eternidade divina e alegria que Deus derrama sobre aqueles que confiam Nele.

d. O conhecimento de Deus é um bem incomensurável. Conhecer Deus, a fonte de infinita bondade e amor, é um bem incomparável, a realização da existência humana. Os sofrimentos dessa vida não podem nem ser comparados a isso. Por isso, a pessoa que conhece Deus, não importa o que ela sofra, não importa quão terrível seja sua dor, ainda pode dizer “Deus é bom pra mim” simplesmente em virtude do fato de ele conhecer Deus, um bem incomparável.

Essas quatro doutrinas cristãs reduzem consideravelmente qualquer improbabilidade que o mal pareceria jogar sobre a existência de Deus.

3. Relativo ao âmbito complete das evidências, a existência de Deus é provável. Probabilidades são relativas à que informação de fundo você considera. Por exemplo, suponha que Joe é um estudante na Universidade do Colorado. Agora suponha que nós somos informados que 95% dos estudantes da Universidade do Colorado esquiam. Relativo a essa informação é altamente provável que Joe esquie. Mas, então, suponha que nós também aprendamos que Joe tem membros amputados e que 95% dos amputados na Universidade do Colorado não esquiam. Repentinamente a probabilidade de Joe ser um esquiador diminuiu drasticamente.

Similarmente, se tudo que você considera como informação de fundo é o mal no mundo, então não é nada surpreendente que a existência de Deus pareça improvável em relação a isso. Mas essa não é a pergunta real. A pergunta real é se a existência de Deus é improvável relativo à totalidade das evidências disponíveis. Eu estou persuadido de que quando você considera a evidência total, então a existência de Deus é bem provável.

Deixe-me mencionar três pedaços de evidência:

a. Deus providencia a melhor explicação de porque o universo existe, ao invés de nada. Você já se perguntou por que qualquer coisa existe, em primeiro lugar? De onde veio tudo? Tipicamente, ateístas disseram que o universo é eterno e não causado. Porém, descobertas na astronomia e astrofísica durante os últimos 80 anos renderam isso improvável. De acordo com o modelo do Big Bang do universo, toda matéria e energia, de fato, o espaço físico e o tempo em si, surgiram em algum ponto cerca de 13.5 bilhões de anos atrás. Antes desse ponto, o universo simplesmente não existia. Portanto, o modelo do Big Bang requer a criação do universo a partir de nada.

Agora, isso tende a ser bem constrangedor para o ateísta. Quentin Smith, um filósofo ateu, escreve:

A resposta de ateus e agnósticos a esse desenvolvimento tem sido comparativamente fraca, de fato quase invisível. Um silêncio desconfortável parece ser a regra quando o assunto surge entre descrentes . . . . A razão do constrangimento de não-teístas não é difícil de encontrar. Anthony Kenny a sugere nessa afirmação: ‘Um proponente da teoria [do Big Bang], ao menos se ele for um ateu, deve acreditar que a matéria do universo veio do nada e por nada.’

Tal dificuldade não confronta o teísta Cristão, visto que a teoria do Big Bang só confirma o que ele sempre acreditou: que no princípio Deus criou o universo. Agora eu lhe pergunto: o que é mais plausível: que o teísta Cristão está certo ou que o universo entrou em existência incausado a partir do nada?

2. Deus oferece a melhor explicação da complexa ordem no universo. Durante os últimos 40 anos, cientistas descobriram que a existência de vida inteligente depende de um complexo e delicado balanço das condições iniciais dadas no próprio big bang. Nós agora sabemos que universos proibidores de vida são vastamente mais prováveis do que qualquer universo que permita a vida como o nosso. Quanto mais provável?

A resposta é que as chances de que o universo possa permitir a vida são infinitesimais ao ponto de serem incompreensíveis e incalculáveis. Por exemplo, uma mudança na força da gravidade ou da força atômica fraca de apenas uma parte em 10100 teria prevenido um universo que permita a vida. A assim chamada constante cosmológica “lambda”, que impulsiona a expansão inflacionária do universo e é responsável pela recentemente descoberta aceleração da expansão do universo está ajustada precisamente em cerca de uma parte em 10120. O físico Roger Penrose, de Oxford, calcula que as chances de a condição especial de baixa entropia do nosso universo, da qual nossa vida depende, ter surgido por chance é pelo menos tão pequena quanto uma parte em 1010(123). Penrose comenta: “Eu não consigo ter ao menos visto alguma outra coisa na física cuja acurácia conhecida se aproxime, mesmo que remotamente, de um número como uma parte em 1010(123).” Há múltiplas quantidades e constantes que precisam ser finamente ajustadas desse jeito para que um universo permita a vida. E não é apenas cada quantidade que precisa ser esquisitamente bem ajustada desse jeito; as proporções entre elas também precisam ser finamente ajustadas. Então improbabilidade é multiplicada por improbabilidade até que nossas mentes estejam enroladas em números incompreensíveis.

Não há nenhum motivo físico porque essas constantes e quantidades devam possuir os valores que elas possuem. O físico uma vez agnóstico Paul Davies comenta: “Através de meu trabalho científico eu vim a acreditar mais e mais fortemente que o universo físico é formado com uma engenhosidade tão incrível que eu não posso aceitar isso meramente como um fato bruto.” Similarmente, Fred Hoyle observa: “Uma interpretação dos fatos pelo senso comum sugere que um super intelecto macaqueou [ou aprontou travessuras] com a física.” Robert Jastrow, ex-dirigente do Instituto Goddard para Pesquisas Espaciais, da NASA, chama essa de a mais forte evidência para a existência de Deus já surgida da ciência.

A visão que os teístas Cristãos sempre mantiveram – de que há um projetista inteligente do universo – parece fazer muito mais sentido do que a visão ateísta de que o universo, quando surgiu incausado do nada, por acaso foi finamente ajustado pela chance com uma precisão incompreensível para permitir a existência de vida inteligente.

3. Valores morais objetivos no mundo. Se Deus não existe, então valores morais objetivos não existem. Muitos teístas e ateístas estão igualmente de acordo nessa questão. Por exemplo, o filósofo da ciência Michael Ruse explica:

A moralidade é uma adaptação biológica não menos do que nossas mãos e pés e dentes. Considerada como um conjunto de afirmações racionalmente justificáveis sobre um algo objetivo, a ética é ilusória. Eu aprecio que quando alguém diz “Ame ao próximo como a si mesmo,” eles pensam que estão se referindo a algo acima e além deles mesmo. De qualquer maneira, tal referência é, de fato, sem fundação. A moralidade é apenas uma ferramenta para a sobrevivência e a reprodução . . . e qualquer significado mais profundo é ilusório.

Friedrich Nietzsche, o grande ateu do século 19 que proclamou a morte de Deus, entendia que a morte de Deus significava a destruição de todo significado e valor na vida.

Eu acho que Friedrich Nietzsche estava certo.

Mas devemos ser bem cuidadosos aqui. A pergunta aqui não é “Precisamos acreditar em Deus para viver vidas morais?”. Eu não estou afirmando que precisamos. Nem é a pergunta “Podemos reconhecer valores morais objetivos sem acreditar em Deus?”. Eu acredito que podemos.

Ao contrário, a questão é: “Se Deus não existe, valores morais objetivos existem?”. Como Ruse, eu não vejo nenhuma razão para pensar que, na ausência de Deus, a moralidade de rebanho evoluída pelo homo sapiens é objetiva. Afinal, se não há nenhum Deus, o que é tão especial nos seres humanos? Eles são apenas subprodutos acidentais da natureza que evoluíram relativamente recentemente em uma partícula infinitesimal de poeira perdida em um universo hostil e irracional, e que estão condenados a perecer individual e coletivamente em relativamente pouco tempo. Na visão ateísta alguma ação, como, por exemplo, o estupro, pode não ser socialmente vantajosa e, portanto, durante o curso do desenvolvimento humano, tornou-se taboo; mas isso não faz absolutamente nada para provar que o estupro é realmente errado. Na visão ateísta, não a nada realmente errado em estuprar alguém. Portanto, sem Deus não há absolutamente nenhum bem ou mal que se imponha em nossa consciência.

Mas o problema é que valores objetivos de fato existem, e no fundo todos nós sabemos disso. Não há nenhuma razão extra para negar a realidade objetiva de valores morais do que a realidade objetiva do mundo físico. Ações como estupro, crueldade e abuso infantil não são apenas comportamentos socialmente inaceitáveis – elas são abominações morais. Algumas coisas são realmente erradas.

De tal maneira, paradoxalmente, o mal na verdade serve para estabelecer a existência de Deus. Pois se valores objetivos não podem existir sem Deus e valores objetivos, de fato, existem – como é evidente a partir da realidade do mal -, então segue-se inescapavelmente  que Deus existe. Portanto, embora o mal em certo sentido ponha em dúvida a existência de Deus, em um sentido mais fundamental ele demonstra a existência de Deus, já que o mal não poderia existir sem Deus.

Essas são apenas partes da evidência de que Deus existe. O proeminente filósofo Alvin Plantinga expôs cerca de duas dúzias de argumentos para a existência de Deus. A força cumulativa desses argumentos torna provável que Deus exista.

Em resumo, se minhas três teses estão corretas, então o mal não torna improvável a existência do Deus Cristão; pelo contrário, considerando-se o âmbito total da evidência, a existência de Deus é provável. Portanto, o problema intelectual do mal falha em derrubar a existência de Deus.

Mas isso nos leva ao problema emocional do mal. Eu acredito que a maioria das pessoas que rejeitam Deus por causa do mal no mundo não fazem isso realmente por conta de dificuldades intelectuais; na verdade esse é um problema emocional. Elas simplesmente não gostam de um Deus que permitiria que eles ou outros sofressem e, portanto, não nada a ver com Ele. O delas é simplesmente um ateísmo de rejeição. Tem a fé Cristã algo a dizer a essas pessoas?

Certamente que sim! Pois ela nos diz que Deus não é um Criador distante ou uma base impessoal do ser, mas um Pai amoroso que compartilha nossos sofrimentos e dores conosco. O Prof. Plantinga escreveu:

Como o cristão enxerga as coisas, Deus não fica de braços cruzados, friamente observando o sofrimento de Suas criaturas. Ele entra em e compartilha do nosso sofrimento. Ele suporta a angústia de ver seu filho, a segunda pessoa da Trindade, relegado a uma morte amargamente cruel e vergonhosa na cruz. Cristo estava preparado para suportar as agonias do próprio inferno . . . a fim de vencer o pecado, e a morte, e os males que afligem nosso mundo, e para nos conferir uma vida mais gloriosa do que podemos imaginar. Ele estava disposto a sofrer em nosso lugar, a aceitar sofrimento do qual não podemos formar nenhuma concepção.

Quando nós compreendemos Seu sacrifício e Seu amor por nós, isso coloca o problema do mal em uma perspectiva inteiramente nova. Pois agora nós vemos claramente que o verdadeiro problema do mal é o problema do nosso mal. Cheios de pecado e moralmente culpados perante Deus, a questão que enfrentamos não é como Deus pode se justificar conosco, mas como nós podemos ser justificados ante Ele.

Então, paradoxalmente, embora o problema do mal seja a maior objeção à existência de Deus, no fim do dia Deus é a única solução ao problema do mal. Se Deus não existe, então nós estamos perdidos, sem esperanças, em uma vida de sofrimento gratuito e não redimido. Deus é a resposta final ao problema do mal, pois Ele nos redime do mal e nos leva à alegria eterna de um bem incomensurável: comunhão com Ele.

Original (confira o site se souber inglês): http://www.reasonablefaith.org/the-problem-of-evil#ixzz24tCahCuz